Vamos aprender a como cuidar de si e do outro ?
Quando a memória começa a falhar, o que sustenta a dignidade não são as lembranças, mas o afeto de quem permanece. Cuidar de alguém com Alzheimer é mais do que oferecer apoio físico, é um gesto profundo de presença, paciência e amor contínuo. É lembrar, por dois, os nomes, os caminhos e as histórias, mesmo quando o outro já não pode. No silêncio da mente, a linguagem do cuidado se torna o mais poderoso elo entre almas.
Como cuidar de um portador de Alzheimer ?
Primeiro ponto, cultivar momentos juntos.
São nesses momentos que nos reconectamos com quem amamos e principalmente quando vivenciamos o Alzheimer de perto. Nunca deixe de estar ao lado de quem está passando por isto, e principalmente, não deixe de incluí-los em momentos em família. Pois, são nestas horas em que podemos vivenciar e construir novas lembranças.
Além disto, outras formas de cuidado é através da estimulação de atividade física, jogos, músicas e caminhadas. Neste momento, é de extrema importância o cuidado com a saúde de maneira redobrada, visando sempre estar melhorando o condicionamento físico e neuronal do familiar com Alzheimer.
A música atua acessando memórias profundas, mesmo que o paciente não consiga se lembrar de tudo, apenas uma melodia é capaz de levá-lo para uma lembraça guardada por anos. Assim como a ex bailarina Marta Cinta González Saldaña, que teve Alzheimer e conseguiu dançar ao escutar a melodia de Lago dos Cisnes de Tchaikovsky.
Isto aconteceu justamente pois a música ativa áreas preservada do cérebro, que mesmo comprometidas pelo Alzheimer, ainda podem funcionar. Pois, existem outras áreas relacionadas à memória musical e movimentos aprendidos que são relembradas quando estimuladas. Incrível não é? Nosso cérebro é uma máquina perfeita!
Para além de resgatar memórias antigas, a música também reduz a ansiedade, agitação e agressividade. Coisas completamente normais neste momento e que podem ser amenizadas com o auxílio de outras ferramentas do nosso cotidiano.
O jogo da memória é uma ferramenta terapêutica muito útil para pessoas com Alzheimer, especialmente nas fases iniciais e moderadas da doença. Ele estimula áreas do cérebro responsáveis pela atenção, associação de imagens e resgate de informações. Para pessoas com Alzheimer, essa prática é muito mais do que um simples passatempo, ela funciona como uma forma leve e eficaz de estimular o cérebro. Isso porque o jogo exige que o paciente utilize sua memória de curto prazo para lembrar onde estão as imagens já reveladas, o que ajuda a manter ativas as áreas do cérebro responsáveis por essa função, como o hipocampo. Outro aspecto importante é que, quando o jogo é feito com imagens ou sons que remetem a experiências pessoais e afetivas, ele pode despertar memórias emocionais e proporcionar uma sensação de conforto, já que ativa conexões sensoriais e emocionais ligadas ao passado.
A leitura, mesmo que seja feita em voz alta para o paciente, é uma atividade extremamente rica e benéfica. Ela não serve apenas para exercitar a cognição, mas também para manter vivo o mundo interno da pessoa com Alzheimer. Quando a pessoa ouve histórias, poesias, notícias ou até mesmo textos familiares, ela ativa áreas do cérebro responsáveis pela interpretação e pela associação de informações, o que pode retardar o declínio cognitivo. Além disso, a leitura pode despertar memórias afetivas, principalmente quando o conteúdo remete a temas, épocas ou lugares familiares. Isso acontece porque o cérebro associa as palavras a experiências pessoais guardadas em regiões ligadas às emoções, criando uma conexão entre o passado e o presente do paciente. A leitura é uma ferramenta terapêutica que ajuda a manter a mente ativa, preserva a comunicação e fortalece o lance de identidade do indivíduo.
Cuidar do próximo é um ato profundamente humano que revela nossa capacidade de empatia, compaixão e responsabilidade coletiva. Quando nos importamos com o outro, não apenas aliviamos sofrimentos, mas também fortalecemos os laços que sustentam a convivência. Como ensinou Martin Buber, é no encontro verdadeiro com o outro que nos tornamos plenamente humanos. O cuidado é um gesto silencioso de amor que transforma tanto quem dá quanto quem recebe, revelando que a vida só encontra sentido real quando vivida em relação e solidariedade.
Vamos relembrar as formas de cuidado ?
1 - Apreciar e cultivar os momentos juntos
2 - Estimular a atividade física
3 - Escutar músicas
4 - Adotar a leitura diária
5 - Jogar jogos que estimulam a memória
6 - Sempre buscar construir um diálogo estimulando a conversação
7 - Estimulação neurocognitiva
8 - Mudança de hábitos
9 - Adoção de uma alimentação saudável
10 - Criar uma rotina que envolva o exercício mental diário
Além destes citados, um dos mais importantes também é a busca por uma alimentação saudável.
Exemplos de alimentos que retardam a progressão do Alzheimer e protege o cérebro:
1 - Frutas vermelhas (miritilo, amora, morango, uva roxa, jabuticaba)
2 - Peixes ricos em Ômega 3 (salmão, sardinha, atum, cavalinha)
3 - Verduras verdes-escuras (espinafre, couve, brócolis, rúcula)
4 - Oleaginosas e Sementes (nozes, castanha do Pará amêndoas, chia, linhaça)
5 - Azeite de oliva extravirgem
6 - Grãos integrais
7 - Chocolate amargo 70%
8 - Alho e Cúrcuma
9 - Laticíneos com pouca gordura ou alternativos fortificados
10 - Água
E agora, como cuidar de quem cuida ?
Cuidar de um familiar com Alzheimer é um gesto de amor, mas também pode ser muito desgastante. Muitos cuidadores acabam se esquecendo de si mesmos, abrindo mão do descanso, lazer e até da própria saúde. Com o tempo, isso pode causar cansaço extremo, estresse, ansiedade e até depressão. É fundamental lembrar que o cuidador também precisa de cuidados. Estar bem física e emocionalmente é essencial para continuar cuidando com qualidade. Buscar apoio, dividir tarefas e respeitar os próprios limites não é egoísmo, é um ato de equilíbrio e responsabilidade. Cuidar de quem cuida é garantir o bem-estar de todos.
Muitas vezes, quem cuida de alguém com Alzheimer não se enxerga mais fora desse papel. De filho ou filha, neto, cônjuge ou amigo, a pessoa passa a ser “o cuidador”. Isso, aos poucos, pode gerar uma perda da própria identidade. Os sonhos, os projetos pessoais, os vínculos sociais vão sendo deixados de lado. E, mesmo fazendo tudo com amor, surge um sentimento silencioso de solidão, e até de culpa por querer um tempo pra si, por pensar em desistir, ou até por sentir raiva em momentos difíceis.
Mas é justamente aí que precisamos abrir espaço para o diálogo: ninguém consegue cuidar bem de alguém se está se apagando no processo. O autocuidado não é um luxo, é uma necessidade. Começando por, aceitar ajuda, buscar momentos de pausa, conversar com outras pessoas que estão passando pela mesma situação. Grupos de apoio, terapias, ou simplesmente desabafar com alguém de confiança já fazem uma enorme diferença. Por isso precisa-se prezar pelo autocuidado, pois, nenhum ser humano consegue cuidar do outro de forma constante e afetiva se não estiver minimamente bem consigo mesmo.
Um grande exemplo de como esta temática é importante, é através da palestra de Fernando Aguzzoli para a TEDxUFCSPA. No vídeo “O Alzheimer não é o fim”, o autor e cuidador compartilha sua experiência ao cuidar da avó com Alzheimer. Com sensibilidade e bom humor, ele mostra que, mesmo diante da perda de memória, ainda é possível construir momentos significativos. Ele destaca que o cuidado deve ir além da doença, valorizando o afeto, a paciência e a presença. O vídeo também reforça a importância do bem-estar do cuidador nessa jornada.
A importância da terapia para o autocuidado
A terapia é um espaço essencial para que o cuidador possa falar sobre suas dores, frustrações e medos sem julgamento. Cuidar de alguém com Alzheimer exige muito emocionalmente, e muitas vezes o cuidador reprime sentimentos para não demonstrar fragilidade. A psicoterapia ajuda a organizar essas emoções, prevenir o esgotamento mental e fortalecer a autoestima. É um lugar seguro onde o cuidador pode se reconectar consigo mesmo, entender seus limites e aprender a cuidar de si com a mesma dedicação que oferece ao outro.
Manter vínculos com amigos é vital para a saúde emocional de quem cuida de alguém com Alzheimer. Esses momentos proporcionam alívio, descontração e uma sensação de normalidade que muitas vezes se perde na rotina intensa do cuidado. Conversar, rir, sair um pouco da rotina e sentir-se acolhido por pessoas queridas ajuda a recarregar as energias e lembrar que, além de cuidador, aquela pessoa continua sendo um ser humano com vida própria. O apoio da amizade é um remédio invisível, mas poderoso.
Quer ficar por dentro de uma maneira mais aprofundada ?
Luto e Alzheimer: Enfrentando a dor da perda com sensibilidade e compreensão
A perda de um familiar acometido pela Doença de Alzheimer é uma experiência profundamente dolorosa, marcada por um luto que muitas vezes se inicia antes mesmo do falecimento. À medida que a doença avança, há um distanciamento gradual da realidade, da memória e dos vínculos afetivos, o que torna o processo ainda mais desafiador. É comum que, diante da partida, surjam sentimentos de culpa, dúvidas sobre o que poderia ter sido feito de forma diferente e a sensação de que sempre haveria algo mais a oferecer. No entanto, é essencial reconhecer que cada cuidado prestado foi feito dentro das possibilidades e limitações de cada momento. O amor, a dedicação e a presença constante são provas incontestáveis do compromisso com o bem-estar daquele que partiu.
O luto não deve ser reprimido, acelerado ou ignorado. Cada uma de suas fases (negação, raiva, tristeza e aceitação) possui um papel fundamental na elaboração da perda. Permitir-se vivenciar essas etapas contribui para a reconstrução emocional e para o fortalecimento diante da ausência. É importante lembrar que não há culpa em, aos poucos, reencontrar a serenidade e passar a se alegrar com as pequenas coisas da vida. Perder alguém para o Alzheimer é vivenciar um tipo de luto único, permeado por múltiplas despedidas. Por isso, é imprescindível acolher a própria dor com gentileza e buscar apoio sempre que necessário. Honrar a memória da pessoa que se foi também é um gesto de cuidado consigo. E seguir em frente, preservando as lembranças e reconhecendo o valor de tudo o que foi vivido, é um caminho legítimo de amor e resiliência.
O Valor dos Momentos na Jornada com o Alzheimer
Ter alguém com Alzheimer na família é um processo longo que traz amadurecimento e uma nova visão da vida. Passamos a valorizar mais os momentos ao lado de quem amamos e também a nossa própria companhia, pois a vida se mostra incerta. Sabemos que, mesmo com prevenção, não há garantia total contra a doença, porém, ela representa uma grande chance de evitar complicações futuras. Por isso, é fundamental aproveitar e valorizar cada instante juntos, vivendo com mais amor, paciência e gratidão.
Referências:
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